Monday, February 7, 2011

A REVOLUÇÃO CONTINUA NO EGIPTO


Reportagem: a praça Tahrir não negoceia e continua em revolução
07.02.2011 - 13:03 Por Paulo Moura, Cairo

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Os membros do comité de representantes da oposição que ontem se encontrou com o vice-presidente, Omar Suleiman, foram à praça Tahrir relatar o acordo que obtiveram. Junto ao palco improvisado, as pessoas aplaudiram. Mas a seguir não se foram embora, o que significa que na verdade não aplaudiram.
A praça Tahrir voltou a encher-se (Foto: Dylan Martinez/Reuters)

"Só uma exigência é comum a toda a gente", diz Ahmed Nagla, 29 anos, médico. "Mubarak tem de partir." As cedências que foram feitas até agora "não significam nada. Nem queremos saber. Equivalem a zero". Mas então a demissão da direcção do partido, a promessa de alterar a Constituição... "Zero. Não acreditamos. Enquanto Mubarak estiver no poder, tudo isso são medidas de fachada, para fazer propaganda na televisão." Mas a eventual demissão do Presidente não poderá também ser uma medida de fachada, para manter o regime intacto? Já a que a única reivindicação dos revolucionários é essa, os líderes militares e do partido do poder poderiam ser tentados a sacrificar Mubarak, para manter o statu quo. Ou instaurar um regime ainda pior.

"Estamos tranquilos quanto a isso, porque o regime não poderá ser pior", responde Ahmed. "O regime nunca esteve tão frágil. Se Mubarak cair, tudo o resto vai a seguir, como um dominó. Veja o que aconteceu na Tunísia. Ben Ali fugiu e o processo de democratização começou imediatamente, com bons progressos". Portanto, mesmo que o comité da oposição venha dizer que chegou a um acordo que implique uma mudança de regime, mas não a demissão de Mubarak, a resposta da praça será: não. "Nós não aceitaremos isso", diz Ahmed. Mas quem é o "nós"?

"Não nos vemos representados nesses elementos dos partidos oposicionistas. Para nós, esses partidos fazem parte do sistema. Não são mais do que uma rosa vermelha na lapela do regime. Podem ter o seu papel, que achamos louvável. Todos temos de dar o nosso contributo. Até a Irmandade Muçulmana, que está aqui a manifestar-se connosco. Têm neste momento os mesmos objectivos que nós. Mas nós não nos identificamos com nenhum". Mas quem é o nós?

Tudo mais organizado

A praça Tahrir voltou a encher-se, respondendo ao apelo de fazer "marchas de um milhão de pessoas" aos domingos, terças e sextas. Mais do que nunca, tudo estava bem organizado. Era mais fácil chegar lá, porque a cidade quase voltou à normalidade. O trânsito voltou a circular, muitas lojas e alguns bancos abriram, acabaram os checkpoints em todos os bairros.

Podia entrar-se na praça por vários pontos, de forma segura e ordeira. Os militares continuavam a colaborar com os voluntários civis nos piquetes que identificavam e revistavam quem queria entrar. Mas uma vez na praça, a organização foi significativamente melhorada. Há "recepcionistas" a dar as boas vindas a todos os que chegam, que são conduzidos através de um corredor formado por cordões humanos, onde se cantam canções de acolhimento. "Queremos que todos os que entram aqui se sintam heróis", explicou um dos organizadores desta recepção, Ayman, que trabalha num hotel.

Em vários pontos da praça, há distribuição de comida, água, chá e café. Alguns vendem bolos e refrigerantes. Numa área do centro da praça, onde há o estaleiro de uma obra que estava em curso, organizou-se um depósito para o lixo. Em vários locais, estão montados os acampamentos. Tendas, plásticos e mantas, que estão a ser doadas por particulares e empresas. Cada vez há mais pessoas a dormir na praça, muitas porque não residem no Cairo.

Nas zonas periféricas há ainda elementos sentados à frente de um monte de pedras, prontos a responder a eventuais ataques dos grupos pró-Mubarak. Em frente dos tanques, formaram-se cordões humanos, para os impedir de avançar sobre a praça, caso passe pela cabeça de Mubarak emitir uma ordem desesperada.

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