Sunday, January 27, 2008


Charles Bukowski, poesia
câncer
charles bukowski

o quarto dela era no alto da
escada.
ela estava sozinha.
“oi, Henry”, ela disse,
“odeio este quarto, ele
não tem janela.”

eu estava com uma tremenda ressaca.
o cheiro estava insuportável,
me senti como se fosse
vomitar.

“eles me operaram há dois dias”,
ela disse. “me senti melhor no dia
seguinte, mas agora estou na mesma, talvez
pior.”

“lamento, mamãe.”

“sabe, você estava certo, seu pai
é um homem horrível.”

pobre mulher, um marido bruto e
um filho alcoólatra.

“com licença, mamãe, eu volto
num instante...”

o cheiro tinha entrado por mim,
meu estômago ficou revirando.
saí do quarto
e desci alguns degraus,
sentei ali
segurando o parapeito,
respirando o ar
fresco.

a pobre mulher.

fiquei puxando o ar e
tentei não
vomitar.

levantei e subi de novo as
escadas e entrei no quarto.

“ele me mandou para uma clínica
psiquiátrica, você
sabia?”

“sim, eu disse a eles
que estavam com a pessoa errada.”

“você parece doente, Henry, você está
bem?”

“estou mal hoje, mãe, amanhã
volto para vê-la
novamente.”
“tudo bem, Henry...”

levantei, fechei a porta, e
desci as escadas.
fiquei lá fora, num jardim
de rosas.

deixei tudo sair no jardim
de rosas.

pobre mulher fodida...

no dia seguinte cheguei com
flores.
subi as escadas até o
quarto.
havia uma coroa de flores na
porta.
ainda assim tentei abrir a porta,
estava trancada.

desci as escadas
passei pelo jardim de rosas
e fui para a rua
onde meu carro estava
parado.

havia duas pequenas meninas
de 6 ou 7 anos de idade
voltando da escola.

“desculpem-me, senhoritas, mas vocês
não gostariam de flores?”

elas pararam e ficaram
me observando.

“tome”, e entreguei o buquê para a
mais alta, “agora você
divide, por favor dê a metade
à sua amiga.”

“obrigada”, disse a menina
mais alta, “elas são muito
bonitas.”

“é verdade”, disse a outra
menina, “muito
obrigada.”

elas foram embora
e eu entrei no meu carro,
dei a partida, e
voltei para
casa.

(“run with the hunted”)

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