Vida estúpida que um gajo leva
vida estúpida que um gajo leva
vida estúpida que um gajo leva
sempre a mesma merda
sempre a mesma merda
sempre a mesma merda
nada de novo
nada de novo
nada de novo
só o tédio
só o tédio
só o tédio
mostra-me a saída
mostra-me a saída
mostra-me a saída
para o prazer
para o prazer
para o prazer
Thursday, October 30, 2008
Ria-me da angústia perante a página em branco mas agora já não o faço. Hoje a coisa custa a sair. Serei mesmo uma espécie de profeta ou apenas um gajo que anda por ai a beber copos, a pôr as coisas em causa? Inclino-me mais para a segunda hipótese. As profecias deixo-as para um possível livro. Talvez algum passado as publique.
Wednesday, October 29, 2008
A BOLSA E O MERCADO
Qual é a lógica das bolsas e dos mercados? Nenhuma, absolutamente nenhuma, a não ser a rapina, o lucro, a agiotagem. Estamos ao serviço de uma lógica que não faz sentido, da filha da putice. Aceitas estar ao serviço da rapina? Aceitas contribuir para a bolsa e para o mercado? Aceitas fazer parte de um mundo sem humanidade? Ou queres seguir Dionisos?
Tuesday, October 28, 2008
NICO (1938-1988)
PALAS ATENA
Este exercício de escrever todos os dias. Ontem estava cheio de pedal e hoje já não estou. Podia-me dar para escrever diálogos, romances e ganhava dinheiro. Tornava-me um escritor profissional como Hemingway. Mas não. Só me dá para escrever estas merdas. Vá lá que há uns gajos do sindicato dos professores que mas publicam. Os professores devem estar tão em baixo que até publicam as minhas coisas. Corações ao alto. Nada de desãnimos. Ulisses já está em Ítaca. Escreve algo de sublime. De sublime, meu, de sublime. Não te deixes arrastar para a cama. Bebe copos, conversa com o mundo. Diz algo de sublime. Algo que surpreenda o mundo. Algo que enfeitice as gajas. Algo que mude a face da Terra. Vem ter comigo, deusa. Sai das trevas que te retém há mil anos, vem ter comigo, ilumina os meus passos, faz de mim um rei. Vem amar-me, deusa. Já que as outras não vêm porque me vêem teso, vem tu. Torna-me sublime, irmão dos deuses. Que se foda o quotidiano banal, que se foda a mesquinhice, que se fodam as telenovelas. Esta merda das coisinhas, das conversinhas, dos grupos fechados dá cabo de mim! Como disse no outro dia uma gaja devo começar a pregar para toda a gente. Dá-me forças, como deste a Ulisses, Palas Atena! Acredito em ti mais do que nas gajas do café. Acredito em ti mais do que no café. Acredito em ti mais do que na aldeia. Acredito em ti, Palas Atena. Ajuda-me. Vem ter comigo. O mundo, salvo algumas ocasiões, é uma merda. Não sou menos do que Ulisses. Já fiz muitas viagens, já vi muitos filmes, já enfrentei muitos demónios, já andei vestido de mendigo, dá-me a glória, Palas Atena. É a glória que eu quero, ó deusa. Para mim e para a Humanidade. Há gajas bonitas na televisão. Saí da televisão, sede as minhas bacantes. Ontem estava em glória mas hoje já não estou. Merda! Palas Atena, porque me abandonas? Estarei condenado a sofrer todas as provações?
CRISE
Prossegue a crise. As bolsas ainda estão em baixa. Essa merda das bolsas sempre me meteu nojo. Para que é que serve essa merda? Mais uma daquelas merdas absurdas que o capitalismo inventou. Fico feliz por estarem em baixa. Fico feliz por o capitalismo estar em baixa. Esta merda deveria rebentar toda. Deveria começar tudo de novo.
O MANIFESTO ENCAPuTADO
Não há gajas, só velhas. Depois da glória vem a pasmaceira. Valha-nos o sol lá fora. O que vale é que um gajo ainda se diverte com os amigos. Valha-nos isso. Ouvir e dizer umas piadas, rir, gozar com esta merda. É o que se leva daqui. A merda da revolução nunca mais vem. E um gajo passa a vida a olhar para as gajas. Cá estou de novo só na confeitaria. Toda a gente trabalha menos eu e o bêbado da aldeia. O que não deixa de ter o seu lado positivo. Os outros que trabalhem! Eu limito-me a escrever estas merdas. Os carros passam lá fora e eu escrevo. Escrevo para mim, para o mundo, para o raio que vos parta! Passo a vida a escrever sem disciplina, sem horários, sem objectivos concretos. Se calhar até vou ganhar o Nobel. Divirto-me a escrever, que querem? Em vez de andar para aí a remoer, escrevo. Em vez de andar à porrada, escrevo. Em vez de bater punhetas, escrevo. É fácil. A coisa sai. E só entram gajas feias e gordas. Queria escrever como Homero, como Shakespeare, mas só me saem estas merdas. E a coisa prossegue. Nunca escrevi tanto como agora. Escrevo compulsivamente, automaticamente, selvaticamente. Parece uma doença. Não me adaptei à vida mas adaptei-me à escrita. Acho piada àquela história da angústia perante a página em branco. Não sinto angústia nenhuma. E a página não está em branco. Sinto prazer- é o prazer que procuro desmesuradamente- Sinto-me em cima. Até parece que as depressões passaram à história. Oxalá seja verdade. Esta merda de escrever tem muito que se lhe diga. Mas a coisa vai fluindo. Há que saber matar com as palavras. Há que saber celebrar com as palavras. Há que fazer amor com as palavras. Deveria viver desta merda. Para quê fazer correcções? Há que deixar a coisa fluir espontaneamente, como um rio, como o mar. Na verdade, poucas gajas me entendem. Algumas vão lá, captam os meus escritos, riem dos meus disparates. Não me venham falar do Bloco de Esquerda! O Louçã tem muitas vezes razão mas é um chato, sempre inquisidor, sempre dono da verdade e da ética. Tenho lá alguns amigos. Mas deixei-me de partidos. O meu partido é o PSSL- Partido Surrealista Situacionista Libertário- de que sou o único militante. Há um blog. Estão abertas as inscrições. O que eu quero é criar um movimento artístico de base. Sem dirigentes nem detergentes, com vanguarda mas sem retaguarda, uma coisa que incomode mas que faça as pessoas rir. Que seja destrutiva e criadora. Que faça as gajas boas dar-me beijos na boca. Que rebente com o governo e que faça o povo rir. Eis o meu manifesto encapotado. Das gajas à revolução. Até as velhas podem participar. Posto isto, vou voltar a Homero.
GLÓRIA
Finalmente a glória. Outra vez a glória. Anda um gajo meio descrente e vem a glória. Já que não vem o dinheiro que venha a glória. A glória dá-nos asas, faz-nos sonhar. Que somos capazes de tudo. Que somos os maiores. Por uns dias, por uns tempos. Só falta que as gajas venham. Só falta mesmo que as gajas venham e não preciso da merda do dinheiro para nada. Encontrei o ritmo certo. Há noites em que as coisas nos caem do céu. Literalmente do céu. Quero que as gajas me caiam do céu! Quero que a revolução me caia do céu! Que se foda a realidade mesquinha do dia-a-dia. Que se foda a vidinha!
Sunday, October 26, 2008
Escrevo logo existo. As gajas da confeitaria conversam. Escrevo todas as porras que me vêm à cabeça. Bem, quase todas. O computador foi para arranjar. Não posso actualizar o blog. Desculpa, Claudinha. Esta noite vou ver-te. Dar-me-às beijos na boca? Preciso de uma mulher na minha vida, senão começo a desanimar. A crise prossegue. Viva a crise!
BEIJOS NA BOCA
Estou a ficar como o Arrabal. Cada vez que vou dizer poesia as gajas deveriam beijar-me na boca. Afinal de contas este é o meu ofício. Já que não recebo dinheiro deveria receber beijos na boca. Afinal de contas venho de um longo exílio. E esta merda de vir para a confeitaria criar tem os seus custos. Gasto o cérebro, gasto a alma, gasto a mão, gasto os olhos, gasto a caneta. O artista tem de ser recompensado de qualquer maneira.
Saturday, October 18, 2008
DULCINEIA
Estarão próximos os meus reinos de outrora?
Virás para mim, Dulcineia?
Ou será que os vendilhões
também te fizeram a cabeça?
Começo a ficar farto de lutar contra os moinhos,
Dulcineia
Começo a ficar farto de andar para aqui e para ali
a pregar a boa nova
será que eles me ouvem, Dulcineia?
Será que eles me seguem, Dulcineia?
Ou será que me chamam nomes, Dulcineia?
Estarão próximos os meus reinos de outrora?
Elas passam, elas olham, mas sará que sabem
quem sou?
Eu próprio não sei quem sou,
dizes-me quem sou, Dulcineia?
Dizem que tenho vários nomes, que adopto várias formas,
que dispo e visto a pele da cobra
dizem que ando por cá há eternidades
estarão próximos os meus reinos de outrora?
Ou isto é apenas mais uma trip?
Sinto-me próximo dos grandes, Dulcineia,
sinto-me na antiga Grécia
à mesa de Sócrates, Platão, Homero e Nietzsche
sinto-me numa nova era
mas hesito, hesito,
será que devo dizer a Palavra?
ARTISTAS
Há artistas que recebem subsídios. E há artistas que andam por aí, pela rua, aos pontapés, acima, abaixo, acima, sem subsídios, sem eira nem beira, a berrar poesia e outros textos, a ensaiar na praia, a pregar a utopia.
Thursday, October 16, 2008
OS REINOS DE OUTRORA
Estarão próximos os meus reinos de outrora?
Virás para mim, Dulcineia?
Ou será que os vendilhões também te fizeram
a cabeça?
Começo a ficar farto de lutar contra os moinhos,
Dulcineia,
começo a ficar farto de andar para aqui e para ali
a pregar a Boa Nova
será que eles me ouvem, Dulcineia?
Será que eles me seguem?
Ou será que me chamam nomes, Dulcineia?
Estão próximos os meus reinos de outrora?
Elas passam, elas olham, mas será que sabem
quem eu sou?
Nem eu sei quem sou, Dulcineia,
dizes-me tu quem sou?
Dizem que tenho vários nomes, que adopto várias formas,
que dispo e visto a pele da cobra
dizem que ando por cá há eternidades
estão próximos os meus reinos de outrora?
Ou isto é apenas mais uma trip?
Sinto-me próximo dos grandes, Dulcineia,
sinto-me na antiga Grécia
à mesa de Sócrates, Platão, Homero e Nietzsche
sinto-me numa nova era
mas hesito, hesito
será que devo dizer a palavra?
A. Pedro Ribeiro, Norteshopping, 16 de Outubro de 2008.
NORTESHOPPING
Depois do médico vim ao "Norteshopping", à catedral do consumo. Venho cá ver as vistas, ou seja, as gajas, se bem que à semana haja pouca gente. Na catedral do consumo escrevo as palavras da loucura. Escrevi isto há anos. Se é loucura ou não, não sei. Mas sinto-me um enviado dos deuses. Um ser que traz o novo mundo, a Idade do Ouro, a era do espírito. Se calhar é mesmo à catedral do consumo que devo vir pregar a Boa Nova. Expulsar, como Cristo, os vendilhões do templo. De facto, devo apelar ao despojamento. Tenho mesmo uma missão. Não vim ao mundo para ter bens e riquezas, embora até possa vir a tê-los. Vim ao mundo pregar a virtude e a justiça. Mas não serei moderado, como Platão e Sócrates apregoavam. Cantarei o caos e o amor. Cantarei a Idade do Ouro, a Era do Espírito de Agostinho da Silva. Mas fá-lo-ei, no palco, de forma caótica, morrisoniana, nietscheana, dionisíaca. Provocarei a audiência, entrarei em choque com a audiência, atearei o fogo. Provocarei fogos como Nero, minha Agripina, escreverei poemas de fogo, cantarei o incêndio. Não procuro a polémica pela polémica. "A estrada do excesso conduz ao palácio da sabedoria", William Blake. Serei excessivo. Não é a provocação pela provocação. É a busca da sabedoria.
Há poetas que dizem que eu não faço correctamente o trabalho poético, que não corrijo os textos "a posteriori". Provavelmente têm razão. Limito-me a fazer uma correcção e depois deixo ficar os textos inalterados. Dizem que eu revelo uma certa imaturidade quando, por vezes, me julgo genial. Talvez haja uma certa razão. Mas o facto é que eu continuo a apostar na espontaneidade, no automatismo e não tenho sido capaz de fazer um trabalho de fundo. Nunca escrevi tanto como agora.
FEITIÇOS
Tuesday, October 14, 2008
Já se passaram eternidades desde que aqui estou
os ocupantes da mesa vizinha estranham
que um gajo esteja continuamente a escrever
em transe
ossos do ofício
Eu trabalho!-como diz o outro
trabalho mas não recebo
trabalho mas não recibo
o Alba escrevia nos bancos de jardim,
à luz dos candeeiros públicos, onde calhava
ainda não cheguei a esse ponto
ainda tenho dinheiro para ir ao café
e a alguns bares
e até há gajos a fazer teses
com os meus poemas.
MANIFESTO DO APOCALIPSE
O que eu realmente odeio é o espírito moedeiro, merceeiro. Essa coisa de sacar o lucro a todo o momento. A agiotagem, a sacanagem, a usura, a ganância, a mesquinhez. Pobres imbecis. Coitados. Não passais de uns pobres imbecis. Não sabeis que aquilo que é grande é a dádiva, a partilha, o amor? O homem não nasceu para trabalhar mas para criar, disse Agostinho da Silva. Bem, alguns nasceram para trabalhar. Coitados. Porque raio tudo há-de ter um preço? Quem inventou a merda dos preços? Quem inventou a merda da moeda? Quantos dormem na rua, quantos passam fome por causa da merda da moeda? QUAL É O PREÇO DA VIDA? DIGAM LÁ! FAÇAM AS CONTAS! É FÁCIL! 5 EUROS? 10 EUROS? 100 EUROS? 1000 EUROS? 5 CÊNTIMOS? QUANTO? DIGAM LÁ! QUANTO VALE A PORRA DA VIDA? QUANTO VALE A PORRA DA LIBERDADE? QUANTO VALE A PORRA DO AMOR? DIGAM LÁ OU PERGUNTEM A ESSES ECONOMISTAS DE MERDA, A ESSES FINANCEIROS DE MERDA, QUE FAZEM AS CONTAS TODAS, QUANTO VALE? Falais dinheiro, comeis dinheiro, cagais dinheiro? É isso que sois? É isso que quereis ser? É a isso que vos aceitais reduzir? Sois a Ana Dinheiro, o João Notas, a Marta Multibanco? Sois a vossa conta bancária? Ou sois seres humanos? Porra, por uma vez! NÃO BATEI PALMAS! NÃO QUERO PALMAS! SÓ QUERO A HUMANIDADE!
IDADE DO OURO
Eis a Idade do Ouro
estou a recuperar os reinos de outrora
dar-te-ei palácios, diamantes,
os jardins suspensos da Babilónia
Moedeiros, profetas da morte!
Chegou a vossa hora
ides ficar sem nada
ides sofrer na pele
o que fizestes outros sofrer
ides trabalhar até À morte!
Idade do Ouro
nâo mais o dinheiro
nâo mais o trabalho
todos os vinhos; todos os beijos
todos os deboches
"a liberdade cor de homem"
a poesia sem fim
OURO
Leio os teus comentários e apetece-me escrever-te cartas à moda antiga. Cartas cheias de amor que me afastem desta merda toda. Ontem no "Pinguim" houve uma gaja que disse que eu só digo que isto é tudo merda, merda, merda. Não é. Porque existes tu e existem outras e outros. Mas a verdade é que as coisas estão difíceis. Estarei eu quase completamente desadaptado ao trabalho e ao sistema do dinheiro? Ou será que estou a chegar à Idade de Ouro e já te posso dar o ouro? Será mesmo verdade que tenho poderes que os outros não têm? Onde estão eles, minha rica? Onde estão os meus reinos de outrora? Estarei a alucinar outra vez? Tu tentas compreender-me, compreendes-me, poucas, muito poucas me compreendem, minha fada.
Beijos na boca e noutros sítios.
ESTA MERDA...
Esta merda da falta de dinheiro fode um gajo. Fica-se a fazer horas pelo "Piolho", a contar os trocos a ver se ainda sobra para uma cerveja. Ou então espera-se alguém para cravar. Mas não se pode cravar sempre ao mesmo gajo. Merda de vida! Essa merda de arranjar um emprego. Já não sei se dou para essa vida. Estou completamente desajustado aos ritmos de trabalho. O Fred bebe na mesa do lado. O Rocha está na ginástica. Esta malta respeita o criador no acto de criação e julga que estou a escrever coisas sublimes. Ando a iluminar a Humanidade e continuo teso. Ando à procura de uma gaja e ela nunca mais aparece. Os poetas chamam-me e vêm falar comigo. Dizem-me que estou com bom aspecto e alguns pedem-me o contacto de editoras. Outros dizem-me que o melhor é mesmo não publicar, ficar no anonimato, à margem, fora dos jornais, não se vender ao mainstream. Dizem-me ainda estão fartos que nos colóquos lhes perguntem o que é a poesia. O que é a poesia? É tudo. Vai desde as deusas às retretes. Mas, de facto, é estúpido responder sempre às mesmas perguntas. E a Gotucha que arranjou namorado e já não me liga...
FORA DO REAL
Ás vezes parece que ando fora da realidade, que crio uma realidade alternativa. A vida desprendida que vou levando afasta-me das convenções sociais, da luta pela sobrevivência. Então vou criando mundos, máximas, profecias.
Sunday, October 12, 2008
Olá, miúda
Olá, miúda, vejo-te passar. Porque não falas comigo? Olá, miúda, pões-me doido. Porque não queres falar comigo? Olá, miúda, porque nos fechamos em grupos? Olá, miúda, ando pela noite a olhar para as miúdas, porque não falais comigo? Olá, miúda, esta merda já é tão imbecil, porque não falas comigo? Olá, miúda, escrevo estas merdas e tu não me ligas puto. Olá, miúda, porque é que só os gajos é que vêm falar comigo? Olá, miúda, porquê tanta fronteira? Olá, miúda, porque é que há controleiros em todo o lado? Olá, miúda, porque é que tudo é tão complicado?
AS GAJAS E A CRIAÇÃO
Há gajas que, à falta de melhor, nos fazem escrever. É uma forma de descarregar a líbido. Mas as gajas brasileiras têm aquele jeito especial, aquele à vontade gingão que nos faz sonhar. Até falam da noitada anterior, do inferno, não sei bem a que inferno se referem. Esse jeito de ocupar o café todo com a conversa. Mas pronto. Começam a falar em empregos e trabalhos e fodem tudo! Está tudo fodido. Lá se vai a poesia. Bem, mas pronto um gajo às gajas perdoa tudo. Depois lá aparece o gajo com a conversa do tem que ser. E as gajas com sinais. Mal sabem que ando a escrever sobre elas. Se calhar, já desconfiam. Sabes lá o que vai na cabeça das gajas. Nunca saberás o que vai na cabeça das gajas. É esse o mistério, é esse o encanto. Agora foram lá para fora fumar. Até tens algum historial com as gajas dos cafés e dos bares. Escreves sobre as gajas. De vez em quando lá aparece uma que se interessa por ti, que gosta realmente de ti mas que depois fica cheia de dúvidas porque andas teso e dificilmente deixarás de andar teso se continuares assim. Tens 10 anos para arranjar uma gaja. Depois dos 50 será difícil a não ser que fiques realmente famoso, ó poeta de combate. Isto se chegares aos 50. Viste bem o que aconteceu aos teus amigos. Sais à noite para ver gajas e só os gajos é que vêm ter contigo, ó bardo underground. E, de repente, mamas à vista. Mamas à tua frente, ao teu lado, em todo o lado. Mas depois só vêm ter contigo os cromos do costume, os loucos, os psicopatas, os desenraízados. Alguns deles vêm-te falar do fim do capitalismo, da nova era, do caos global. Outros só falam de conas e mamas e comentam as conas e as mamas à beira das conas e das mamas e o Rocha sente-se envergonhado. Outros ainda vêm-me contar a vida toda como se viessem ao psiquiatra. A verdade é que estou a perder todos os preconceitos na escrita. Até as gajas feias vêm de mamas à mostra. Há 20 anos não era assim. Às vezes dizes que nasceste no século errado, no tempo errado mas, se calhar, tu é que andas errado. Se calhar este é o teu tempo, o teu século, ó poeta dionisíaco. Começas a ficar com a língua de fora, ó poeta dionisíaco. Terás as mulheres que quiseres, ó poeta dionisíaco. Fodes as gajas com os olhos e com a caneta, ó Dionisos. Agora sim, és sublime. Se calhar há já algum tempo que não se escrevia assim. Que importa se te publicam ou não se te sentes sublime. Abençoados os olhos que te deram, ó poeta imoral. Já não usas a razão. A caneta corre automática. Há fêmeas em vilar do Pinheiro, finalmente. Hoje é o dia. O dia da viragem. Nunca mais andarás teso. Nunca mais obecederás. Regressas hoje ao Uno Primordial. Fodes as gajas com os olhos e com a caneta. Mas ama-las. Todas as mulheres são tuas irmãs. Todas as mulheres são tuas irmãs. Irmãs, dai-me o vosso amor. Irmãs, dai-me o Amor. Dançai para mim em redor da fogueira. O mundo novo começa aqui. O mundo novo começa agora. À nossa frente abrem-se eternidades. Podemos ficar tão bem juntos, querida. Podemos ficar tão bem juntos. Amo-te com os olhos e com a caneta. Amo-te com os olhos e com a caneta. Criei-te. És minha. Criei-te. Vieste. És minha. Criei-te. Lês revistas. És minha. Nunca mais escreverei assim.
FACADAS NA MORAL
Vêm ao rio
carregadas de bebés
Gin puro
beijam os putos
enchem-nos de tesão
e rock n' roll
cravos vermelhos
na Junta de Freguesia
bacantes em guerra
antónio
dionisos
na imagem
no BI
no papel
hei-de morrer de tédio
ao quarto dia
num quarto de hotel
mães que choram
cães danados
irmãos irmãs
partilhas pastilhas
fantasias
em Braga sem nada
sem mulheres
no cu na cona
da Flávia
10 da noite
nada na roleta
bate a punheta
primeiro-ministro
Jesus na cruz
aulas
professoras
aguas das pedras
pedrada salgada
Carla em Braga
em Bragança
nos Passos da dança
nos paços da Sé
Che ébrio
luz de morte
coca cola cao
cão cabrão
equilibrista, não!
Saloon exibicionista
estoirar
bar aberto canção
tiro aos bonecos
aos mortos
aos matrecos
badamecos
noitadas
gargantas secas
TER O MUNDO NA MÃO
E ANDAR AOS TROCOS
aos rotos
às facadas na moral!
A. Pedro Ribeiro, Braga, 2010.
Thursday, October 9, 2008
DIÁRIO
A minha amiga Cláudia diz que eu deveria escrever um romance, pegando em alguns escritos que já tenho. Não sei se serei capaz. Essa coisa de inventar personagens raramente veio ter comigo. A merda do sol é que vem ter comigo. Já estou a suar. Quero escrever algo de genial. Algo que altere o curso da humanidade. No outro dia perdi a hípótese de meter conversa com a Joana. A verdade é que ela é comprometida. Na verdade o que quero é recuperar a alma. Ontem andava um pouco por baixo. Quero escrever algo que faça as pessoas rir. A beatriz diz que ando pelo rap. Tenho saudades de andar com o ego inflamado. Estava sempre a auto-elogiar-me mas, ao menos, a coisa saía. Meu caro amigo, não tenhas ilusões! O mundo é realmente uma merda. Por muito em cima que estejas, chegas à conclusão que este é um mundo de rapina, de filha da putice, de aldrabice, de finança. Quanto mais aldrabas mais bem sucedido és. É claro que agora a coisa está a dar uma volta. A merda do sistema financeiro não passa de uma fantasia. O dinheiro vai e não volta.
Tuesday, October 7, 2008
DYONISOS
Dyonisos senta-se
em plena crise
não há mulheres
à sua mesa
elas refugiam-se à sombra
do conforto da segurança
Dyonisos sabe
que está a chegar
a sua hora
em breve terá início
a corrida aos bancos
o caos o desespero
o fim desta era
Dyonisos sabe
que as bacantes
vão dançar
à sua mesa
Dyonisos sabe
que é ele o poeta
e que tudo
vai ficar
sem cheta.
A. Pedro Ribeiro, Vilar do Pinheiro, 7.10.2008
FILÓSOFO
Queria ser um filósofo e expôr as minhas teses. Mas não apelaria à moderação como Sócrates e Platão. Apelaria ao excesso, ao prazer, à trip, à bebedeira. Combateria a pasmaceira. Mas isso não me impediria de apelar à sabedoria, à virtude e mesmo a uma certa bondade.
Quero ser um filósofo e apelar ao fim da ditadura televisiva: ao fim dos programas imbecis, dos telejornais manipulados, das telenovelas. Quero combater a sociedade-espectáculo. Dizer que há um mundo mais puro, mais livre, dentro do espírito, dentro da alma. Dizer que o apego ao dinheiro é um instinto inferior, próprio dos mercadores e dos comerciantes, como dizia Platão. Dizer que o capitalismo, o livre fluir do mercado, destrói o homem. Dizer que está nos Poetas, intérpretes do divino, a salvação do mundo. Dizer que no espírito dionisíaco, báquico, de algumas mulheres também está a salvação. Dizer que nós, espíritos livres, devemos gozar com esta crise que poderá significar o descalabro do capitalismo e dos "espíritos" tacanhos.
Estou na "Padaria Vilar 2". A boazona só trabalha ao fim de semana. Mas há gaja bonita à vista. Fazem-me falta as gajas. Não estou a falar só de sexo. Faz-me falta falar com elas, contar-lhes coisas, rir-me com elas.
Hoje definitivamente não estou nos meus dias. Os homens bebem ao balcão. A TV vomita burguesias.
Monday, October 6, 2008
SHELLEY
SONETO: A INGLATERRA EM 1819
Um rei velho, louco, cego, desprezado e moribundo, -
Príncipes, a escória da sua triste raça, que fluem
Através do escárnio público, - lama saída de uma fonte lodosa, -
Governantes que não vêem, nem sentem, nem sabem
Mas que se agarram como sanguessugas ao seu país agonizante,
Até que caem, cegos pelo sangue, sem que os toquem, -
Um povo morto à fome e apunhalado no campo por cultivar, -
Um exército, em que o liberticídio e a pilhagem
Fazem uma espada de dois gumes para todos aqueles que a
brandem, - Leis de ouro e sangue que tentam e matam;
Religião sem Cristo, sem Deus - um livro selado;
Um Senado - a pior instituição do Tempo, não revogado, -
São sepulturas, de onde um glorioso Fantasma pode
Brotar, para iluminar o nosso dia tempestuoso.
Trad. Célia Henriques.
Percy Bysshe Shelley nasceu em Inglaterra a 4 de Agosto de 1792. Pertencente a uma família aristocrática, foi matriculado em Oxford a 10 de Abril de 1810. Nesse ano publica o seu primeiro romance gótico: Zartrozzi. Em 1811 é expulso de Oxford na sequência da publicação do panfleto A Necessidade do ateísmo. Inicia então uma vida repleta de casos que o levam ao exílio voluntário. Casa com Harriet Westbrook, de quem terá dois filhos. Separa-se de Harriet, que acabará suicidando-se, e junta-se àquela que virá a ser Mary Shelley, filha de Mary Wollstonecraft, pioneira da emancipação feminina. Foi admirador de Wordsworth, amigo de Lord Byron e de Keats, considerado pelos do seu tempo um infiel, um iconoclasta farsante. Ateu, poeta elegíaco, satírico, panfletário, inimigo da religião, da realeza e da tirania política, foi ignorado ou mal lido depois da morte, ocorrida a 8 de Julho de 1822, por afogamento. O poema aqui reproduzido foi copiado de A Máscara da Anarquia – poema escrito por ocasião do massacre de Manchester seguido de Cinco poemas de 1819, &etc., Setembro de 2008.
Retirado de http://antologiadoesquecimento.blogspot.com
Um rei velho, louco, cego, desprezado e moribundo, -
Príncipes, a escória da sua triste raça, que fluem
Através do escárnio público, - lama saída de uma fonte lodosa, -
Governantes que não vêem, nem sentem, nem sabem
Mas que se agarram como sanguessugas ao seu país agonizante,
Até que caem, cegos pelo sangue, sem que os toquem, -
Um povo morto à fome e apunhalado no campo por cultivar, -
Um exército, em que o liberticídio e a pilhagem
Fazem uma espada de dois gumes para todos aqueles que a
brandem, - Leis de ouro e sangue que tentam e matam;
Religião sem Cristo, sem Deus - um livro selado;
Um Senado - a pior instituição do Tempo, não revogado, -
São sepulturas, de onde um glorioso Fantasma pode
Brotar, para iluminar o nosso dia tempestuoso.
Trad. Célia Henriques.
Percy Bysshe Shelley nasceu em Inglaterra a 4 de Agosto de 1792. Pertencente a uma família aristocrática, foi matriculado em Oxford a 10 de Abril de 1810. Nesse ano publica o seu primeiro romance gótico: Zartrozzi. Em 1811 é expulso de Oxford na sequência da publicação do panfleto A Necessidade do ateísmo. Inicia então uma vida repleta de casos que o levam ao exílio voluntário. Casa com Harriet Westbrook, de quem terá dois filhos. Separa-se de Harriet, que acabará suicidando-se, e junta-se àquela que virá a ser Mary Shelley, filha de Mary Wollstonecraft, pioneira da emancipação feminina. Foi admirador de Wordsworth, amigo de Lord Byron e de Keats, considerado pelos do seu tempo um infiel, um iconoclasta farsante. Ateu, poeta elegíaco, satírico, panfletário, inimigo da religião, da realeza e da tirania política, foi ignorado ou mal lido depois da morte, ocorrida a 8 de Julho de 1822, por afogamento. O poema aqui reproduzido foi copiado de A Máscara da Anarquia – poema escrito por ocasião do massacre de Manchester seguido de Cinco poemas de 1819, &etc., Setembro de 2008.
Retirado de http://antologiadoesquecimento.blogspot.com
Sunday, October 5, 2008
BRASILEIRA
A exuberância da empregada brasileira faz-me esquecer Sócrates e Platão. Como ela anda, como ela ginga. Finalmente alguma acção nesta terra. Morte ao tédio! Abaixo a pasmaceira! Até já tirei o casaco. Ai, aquele cu! Olha, agora desapareceu. Refugiou-se na arrecadação. Que se foda o futebol! O Sporting e o Porto que se enrabem um ao outro. Finalmente alguma acção. E a gaja não volta. Deve estar a masturbar-se. Estou a ficar como o Quim. Conas aos saltos! Conas aos saltos! Que se foda a televisão! Que se foda o big brother e a sociedade-espectáculo! um simples "olá!", a forma como disse "olá", o porte, a pose, a naturalidade, até me assustou! Que se fodam os futeboleiros da terra. Vou mijar.
SÓCRATES
(Sócrates) "tentando persuadir cada um de vós a olhar por si e a procurar a virtude e a sabedoria, ao invés de andar à procura dos seus interesses particulares".
(Platão, "Apologia de Sócrates)
Missão de Sócrates: motivar os homens para cuidarem do seu valor mais nobre, da sua alma, e para adquirirem a sabedoria e a virtude.
A CRISE
Foge! Olha que a crise anda atrás de ti!
Os capitalistas estão aos papéis
os economistas fazem contas
os bancos fecham
a alta finança está a arder
Foge! Olha que a crise anda atrás de ti!
A crise vai devorar-te
a crise vai torturar-te
a crise veio para ficar
Foge! Olha que a crise anda atrás de ti!
Vai ficar tudo negro
vai ficar tudo morto
vem aí o juízo final!
Foge! A crise anda atrás de ti!
Vais ficar sem dinheiro
vais ficar sem trabalho
vais ficar nas mãos do Estado
Foge! A crise anda atrás de ti!
Fecha-te em casa
com a tua namorada
agarra-te à televisão
mas olha que a crise sabe onde te escondes
a crise vigia todos os teus passos
a crise vai-te apanhar
Foge! A crise anda atrás de ti!
A crise infiltra-se no teu cérebro
a crise não tem remédio
a crise pega-te doenças venéreas
a crise enche-te de terror
Foge! Olha que a crise anda atrás de ti!
Friday, October 3, 2008
O JOGO
As minhas sessões de poesia estão a tornar-se num misto de comício, happening e ritual xamânico e profético. Pretendo eliminar as fronteiras entre o performer e o espectador, provocar o choque, influenciar as consciências, provocar o riso, ridicularizar, inclusivé insultar o público. Tenho consciência de que estou a jogar um jogo, mas é o meu jogo não é o jogo do capitalismo nem do Estado. É o meu jogo. Só entra nele quem quer. Dou-vos a liberdade. A Liberdade Absoluta. Eu tenho saído várias vezes do jogo deles. Como dizia o Jim: estás a meio de uma partida de futebol para a Liga dos Campeões e há uma dessas vedetas que dá um pontapé displicente na bola para fora, sem que ninguém o espere, sem haver substituições, abandona o relvado. O estádio inteiro levanta-se: "Eh pá, o gajo é doido! Ponham na rua esse palhaço imbecil!" E, no entanto, o gajo só queria dizer: isto não passa de um jogo, andamos a correr como imbecis atrás da bola, se ainda fosse atrás de uma mulher...toda a gente, colegas de equipa inclusivé, o insulta, todos o rejeitam da mesma forma que os homens da caverna de Platão ("Alegoria da Caverna") rejeitam o homem que foi capaz de sair da caverna e de ver a luz: também lhe chamam doido, utópico, fantasista quando ele regressa à caverna para contar o que viu no exterior. É esse o preço que temos de pagar quando abandonamos o jogo: a solidão, a imensa solidão: "Solitário, abandona a multidão, segue o caminho que conduz a ti mesmo", dizia Nietzsche. É aí que quero chegar. É aí que temos de chegar. Depois, sim, voltaremos à cidade, à multidão, mais sábios mas correndo ainda todos os riscos.
Thursday, October 2, 2008
E O CAPITAL A ARDER, A ARDER
Presidente do BCE descarta iniciativa semelhante ao plano Paulson
Trichet: actual crise é um acontecimento sem precedentes desde a II Guerra Mundial
02.10.2008 - 21h12
Por AFP, PÚBLICO
Kai Pfaffenbach/Reuters
Trichet pede mais coordenação aos governos europeus
O Presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, afirmou hoje que a actual crise financeira constitui um acontecimento “sem precedentes desde a II Guerra Mundial” e pediu uma maior cooperação dos países europeus para a enfrentar.
“Nada no passado se assemelha ao que assistimos actualmente”, afirmou o líder da entidade central, em entrevista ao canal de notícias France 24, antes de acrescentar: “Os acontecimentos que enfrentamos são provavelmente os mais graves desde a II Guerra Mundial”.
Num discurso próximo do alarmismo, Trichet diz que as economias enfrentam “um fenómeno de grande, grande dimensão” e devem esperar “um período de incerteza absolutamente excepcional”.
Sublinhando que na origem desta crise estão fenómenos que “não deveriam ter acontecido”, como a subida em flecha do crédito malparado nos EUA ou o recurso a instrumentos financeiros duvidosos, o presidente do BCE insistiu na necessidade de “passar em revista todos os elementos do sistema financeiro mundial”, com o objectivo de “proceder a alterações muito profundas”.
Trichet – que vai participar na mini-cimeira convocada pela presidência francesa da UE para debater a crise financeira – disse que os Governo europeus “terão de tomar decisões difíceis e rápidas face às circunstâncias” mas descartou, para já, a adopção de um plano de intervenção pública semelhante ao elaborado pela Administração norte-americana.
“Veremos o que será decidido na reunião de Paris, mas dizer que temos, obrigatoriamente, de imitar o que os americanos fizeram é ingénuo, porque nós não somos os EUA”.
Questionado sobre a forma como a UE deve enfrentar a turbulência, Trichet disse que os Governos devem agir de forma “a que o conjunto dos seus interesses possa ser melhor coordenado”.
Por outro lado, Trichet diz que os riscos de uma subida da inflação foram contidos, “mas não eliminados”, razão pela qual o BCE optou hoje por manter a sua taxa directora nos 4,25 por cento, contrariando os apelos de vários países para uma redução do custo do dinheiro.
Apesar de as taxas interbancárias estarem muito acima deste valor, devido à incerteza que rodeia o mercado, Trichet lembrou que em Inglaterra a taxa directora está nos cinco por cento. “Mas no BCE não somos rígidos e podemos agir a qualquer momento” se tal se justificar, acrescentou.
PÚBLICO
XAMÃ
O Xamã
O xamã é um ser sem regras, não sabe o que vai encontrar em seu caminho. Cada dia, cada momento vive para descobrir o maravilhoso e o horripilante. De uma ou de outra forma sabe que ambas são faces de sua própria visão. Não se apega porque sabe que tudo muda, que tudo é impermanente e se deleita com o desconhecido. O tédio não é parte de sua vida... Seu corpo é frágil porque lida com forças terríveis e magnificentes.
Observa o universo como seu Pai e a Terra como sua Mãe...
Vive em completo desapego, até o ponto de ser odiado... Odiado por não dar importância ao que os demais dão importância. O xamã sabe e só sorri, só olha, só observa.
O xamã é produto do amadurecimento de um coração. Do amadurecimento do espírito. Somente um coração maduro entra no caminho do xamã e, uma vez que se entra, se dá conta de que o mesmo caminho, cedo ou tarde, fará com que seu coração desapareça na imensidão do coração desse maravilhoso universo.
Nota: (Autor desconhecido.)
Wednesday, October 1, 2008
CESARE PAVESE
O INSTINTO
O homem velho, desenganado de tudo,
da soleira da porta, sob o sol cálido,
observa o cão e a cadela a satisfazerem o instinto.
Sobre a sua boca desdentada perseguem-se as moscas.
A sua mulher há muito que morreu. Também ela,
como todas as cadelas, não queria saber disso,
mas não lhe faltava o instinto. O homem velho cheirava o ar
- ainda tinha dentes -, a noite vinha,
metiam-se na cama. Era bonito o instinto.
O que agrada no cão é a grande liberdade
De manhã à noite vagueia pela rua;
e ora come, ora dorme, ora monta cadelas:
não espera sequer pela noite. Raciocina
com o faro, e os cheiros que sente são seus.
O homem velho recorda-se de uma vez
em que o fez como os cães, de dia, no meio duma seara.
Já não sabe com que cadela, mas lembra-se do grande sol
e do suor e da vontade de nunca mais acabar.
Era como numa cama. Se os anos voltassem,
gostaria de o fazer sempre no meio duma seara.
Desde a rua uma mulher e pára a olhar;
o padre passa e volta-se. Na praça pública
pode-se fazer tudo. E até a mulher,
que tem pudor em voltar-se para o homem, pára.
Só um rapaz não tolera o jogo
e faz chover pedras. O homem velho indigna-se.
(Cesare Pavese, Trabalha Cansa, Trad. e Introdução de Carlos Leite, Cotovia, 1997, pp. 265-267)
Cesare Pavese nasceu há precisamente cem anos em Santo Stefano Belbo; estudou em Turim, tendo apresentado uma tese sobre Walt Whitman. Pertenceu ao Partido Comunista Italiano e trabalhou como tradutor para a editorial Einaudi. Poeta e ficcionista, dele estão traduzidos para português vários livros como o seu diário, Ofício de Viver, ou as narrativas A Lua e as Fogueiras, Férias de Agosto, A Praia, O Verão, A Guitarra Quebrada, O Diabo sob as Colinas, Noites de Festa (estas últimas editadas nos anos 60 e 70 estão esgotadas). A sua poesia está compilada no volume Trabalhar Cansa (Cotovia). Suicidou-se a 27 de Agosto de 1950.
Retirado de http://discursodosdias.blogspot.com
O homem velho, desenganado de tudo,
da soleira da porta, sob o sol cálido,
observa o cão e a cadela a satisfazerem o instinto.
Sobre a sua boca desdentada perseguem-se as moscas.
A sua mulher há muito que morreu. Também ela,
como todas as cadelas, não queria saber disso,
mas não lhe faltava o instinto. O homem velho cheirava o ar
- ainda tinha dentes -, a noite vinha,
metiam-se na cama. Era bonito o instinto.
O que agrada no cão é a grande liberdade
De manhã à noite vagueia pela rua;
e ora come, ora dorme, ora monta cadelas:
não espera sequer pela noite. Raciocina
com o faro, e os cheiros que sente são seus.
O homem velho recorda-se de uma vez
em que o fez como os cães, de dia, no meio duma seara.
Já não sabe com que cadela, mas lembra-se do grande sol
e do suor e da vontade de nunca mais acabar.
Era como numa cama. Se os anos voltassem,
gostaria de o fazer sempre no meio duma seara.
Desde a rua uma mulher e pára a olhar;
o padre passa e volta-se. Na praça pública
pode-se fazer tudo. E até a mulher,
que tem pudor em voltar-se para o homem, pára.
Só um rapaz não tolera o jogo
e faz chover pedras. O homem velho indigna-se.
(Cesare Pavese, Trabalha Cansa, Trad. e Introdução de Carlos Leite, Cotovia, 1997, pp. 265-267)
Cesare Pavese nasceu há precisamente cem anos em Santo Stefano Belbo; estudou em Turim, tendo apresentado uma tese sobre Walt Whitman. Pertenceu ao Partido Comunista Italiano e trabalhou como tradutor para a editorial Einaudi. Poeta e ficcionista, dele estão traduzidos para português vários livros como o seu diário, Ofício de Viver, ou as narrativas A Lua e as Fogueiras, Férias de Agosto, A Praia, O Verão, A Guitarra Quebrada, O Diabo sob as Colinas, Noites de Festa (estas últimas editadas nos anos 60 e 70 estão esgotadas). A sua poesia está compilada no volume Trabalhar Cansa (Cotovia). Suicidou-se a 27 de Agosto de 1950.
Retirado de http://discursodosdias.blogspot.com
LEVI CONDINHO
LEVI CONDINHO
Juro uma vingança grave sobre
toda esta falta de viver
juro uma treva um nó de madeira obsessivo
uma mancha de podridão na abóbora
ou no pepino enroscado na terra aguada
juro uma unha roxa no rouxinol amado
um ponto negro nas tuas nádegas de concurso
um baque no peito uma recus no planeta mais visível
juro o estalar da pedra nas patas do sardão
juro o próprio sardão
juro os teus mamilos na raiva do silêncio
juro o bornal apodrecido de Kerouac em Bordéus
onde a viagem morreu na baiúca do vinho
juro o vinho (a) martelo no resvés das pedras calcárias
basalto cilício cortiço de zângões
juro as águas de velhas torneiras ferrugentas
e palavras e signos e símbolos sublimes
odeio Céline do meu lado esquerdo
e amo Céline do meu lado direito
ficando por cima como arcanjo astuto
juro mordendo este copo esta trégua este luxo
este ser disponível para tudo abrir
caixa de veludo calo do mindinho erva de plantar
no jardim falido de um ânus loiro profundo
ânus olho juro
Levi Condinho nasceu em 1941, em Bárrio (Alcobaça). Publicou, entre outras obras Para que Alguns me Possam Amar (1977), Saxofone (1981), Tentáculos (1981). Em Roteiro Cego faz uma antologia da sua produção poética entre 1965 e 2000. É também tradutor e crítico, com vários ensaios publicados na Colóquio/Letras.
Retirado de http://discursodosdias.blogspot.com
Juro uma vingança grave sobre
toda esta falta de viver
juro uma treva um nó de madeira obsessivo
uma mancha de podridão na abóbora
ou no pepino enroscado na terra aguada
juro uma unha roxa no rouxinol amado
um ponto negro nas tuas nádegas de concurso
um baque no peito uma recus no planeta mais visível
juro o estalar da pedra nas patas do sardão
juro o próprio sardão
juro os teus mamilos na raiva do silêncio
juro o bornal apodrecido de Kerouac em Bordéus
onde a viagem morreu na baiúca do vinho
juro o vinho (a) martelo no resvés das pedras calcárias
basalto cilício cortiço de zângões
juro as águas de velhas torneiras ferrugentas
e palavras e signos e símbolos sublimes
odeio Céline do meu lado esquerdo
e amo Céline do meu lado direito
ficando por cima como arcanjo astuto
juro mordendo este copo esta trégua este luxo
este ser disponível para tudo abrir
caixa de veludo calo do mindinho erva de plantar
no jardim falido de um ânus loiro profundo
ânus olho juro
Levi Condinho nasceu em 1941, em Bárrio (Alcobaça). Publicou, entre outras obras Para que Alguns me Possam Amar (1977), Saxofone (1981), Tentáculos (1981). Em Roteiro Cego faz uma antologia da sua produção poética entre 1965 e 2000. É também tradutor e crítico, com vários ensaios publicados na Colóquio/Letras.
Retirado de http://discursodosdias.blogspot.com
MANIFESTO/CÂNTICO ÀS GAJAS (BOAS)
MANIFESTO/CÂNTICO ÀS GAJAS (BOAS)
Ontem tive uma daquelas conversas intermináveis acerca do destino do Homem e da Humanidade. O meu amigo diz que estamos aqui para sofrer o menos possível. Mas para quem tem sede de infinito, para quem acredita no Amor e na Liberdade sem limites isso não deixa de fazer confusão. A verdade é que quase ninguém tem este tipo de conversas. A verdade é que para ser um profeta tenho de partir muita pedra. Falar para milhares de pessoas: eis a meta. Chegar à televisão e dizer a palavra. A palavra-chave é o tédio. Eis o que vejo: TÉDIO. Com ou sem trabalho. Com ou sem dinheiro. Talvez as gajas façam a diferença. Mas elas têm de ser generosas para nós poetas. Mesmo que estejamos na miséria, sobretudo aí. Mesmo que estejamos na loucura. Elas (gajas) têm de dar-se a nós poetas e pensarem menos no conforto e na segurança. Têm de se dar a nós porque nós trazemos a divindade e a sabedoria. Têm de se dar a nós em vez de se darem aos futebolistas. Têm de se dar a nós como se dão a Dionisos porque ficam loucas como as bacantes. Têm de perceber que o trabalho não serve para nada. Têm de perder o medo que sentem de nós, têm de dançar na montanha, na floresta e na cidade, têm de fazer fogueiras e queimar o dinheiro. Sim, talvez a salvação esteja nas gajas. As gajas têm de se deixar levar pela loucura, têm de ser xamânicas e dionisíacas. Por isso, cantarei loucamente as mulheres. Por isso, lhes dedicarei hinos. Por isso, serei Dionisos.
Ontem tive uma daquelas conversas intermináveis acerca do destino do Homem e da Humanidade. O meu amigo diz que estamos aqui para sofrer o menos possível. Mas para quem tem sede de infinito, para quem acredita no Amor e na Liberdade sem limites isso não deixa de fazer confusão. A verdade é que quase ninguém tem este tipo de conversas. A verdade é que para ser um profeta tenho de partir muita pedra. Falar para milhares de pessoas: eis a meta. Chegar à televisão e dizer a palavra. A palavra-chave é o tédio. Eis o que vejo: TÉDIO. Com ou sem trabalho. Com ou sem dinheiro. Talvez as gajas façam a diferença. Mas elas têm de ser generosas para nós poetas. Mesmo que estejamos na miséria, sobretudo aí. Mesmo que estejamos na loucura. Elas (gajas) têm de dar-se a nós poetas e pensarem menos no conforto e na segurança. Têm de se dar a nós porque nós trazemos a divindade e a sabedoria. Têm de se dar a nós em vez de se darem aos futebolistas. Têm de se dar a nós como se dão a Dionisos porque ficam loucas como as bacantes. Têm de perceber que o trabalho não serve para nada. Têm de perder o medo que sentem de nós, têm de dançar na montanha, na floresta e na cidade, têm de fazer fogueiras e queimar o dinheiro. Sim, talvez a salvação esteja nas gajas. As gajas têm de se deixar levar pela loucura, têm de ser xamânicas e dionisíacas. Por isso, cantarei loucamente as mulheres. Por isso, lhes dedicarei hinos. Por isso, serei Dionisos.
Subscribe to:
Posts (Atom)